publicado a: 2017-03-07

Matemática

No outro dia, ao dar uma espreitadela ao livro de matemática do 7º ano da minha filha, lembrei-me que terá sido na mesma altura que esta disciplina me começou a assustar. Quando escolhi a área de científico-naturais no 10º ano fi-lo com aquela sensação de coragem, de aluno que não desistia perante a disciplina difícil. Até que cheguei a Agronomia e enfrentei o monstro.

A minha geração de agrónomos (e muitas outras) foi educada num profundo terror pela “Disciplina do Pavilhão dos P's”. Sem querer discutir o grau de exigência e a capacidade académica e pedagógica dos professores (porque os havia bons e maus, como em todo lado), houve um facto que me marcou profundamente: a falta de ligação da matemática que nos era ensinada com a realidade que iríamos encontrar. Isto talvez fruto de um método de ensino muito orientado para os ensaios e não para o trabalho de campo, tal como o nome da disciplina “Estatística e Delineamento Experimental”.

O trabalho de campo é (ou deve ser) essencialmente um apoio à tomada de decisão: se o produtor deve ou não deve tratar a cultura antes da próxima chuva, que quantidade e tipo de adubo vai utilizar na próxima semana, se a rega deve começar já ou esperamos mais uns dias. Mas para que esta decisão seja tomada com um mínimo de risco, deve ser baseada em factos e dados.

Ora a recolha de um número suficiente e significativo de dados não é possível com a nossa forma de pensar atual. Não podemos fixar o tamanho da amostra a priori, em 1000 frutos ou 100 árvores, independentemente dos dados que vamos encontrar. Mais, não podemos pensar que recolher (e registar) um número reduzido de dados, inferior ao que é exigido nos protocolos, não vale nada. Porque vale.

Não é possível, em organizações com recursos humanos limitados, e em que os técnicos são cada vez mais responsáveis por trabalho burocrático, respeitar os protocolos de amostragem. Este facto afastou os técnicos e os produtores da importância de quantificar (medir) e registar. Tornou-nos a todos susceptíveis a enviesamentos e dependentes da memória. Será que no ano imediatamente depois de um ano com grandes ataques de míldio se fazem mais tratamentos?

Por isso, ao adaptarmos a tecnologia à agricultura devemos pensar antes de mais em ferramentas que tornem o registo da informação fácil. Que este processo não seja um problema. Para que possamos, a posteriori extrair conhecimento verdadeiramente adaptado à nossa realidade. Para o fazermos vamos necessitar da matemática, mas ensinada e utilizada de outra forma e apoiada por novas tecnologias.

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