publicado a: 2018-05-09

Cientistas usam bactérias para ajudar plantas a resistir à seca

Um grupo de bactérias possui grande potencial para auxiliar plantas a sofrer menos com os efeitos da falta de água. Através de um trabalho inédito para agricultura tropical, investigadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária São Paulo (Embrapa) descobriram que esses microrganismos conseguem reduzir os efeitos do stress hídrico em soja, milho e trigo, além de propiciar maior crescimento a essas espécies vegetais.

A expectativa dos cientistas é viabilizar, no futuro próximo, o uso dessas bactérias para tratamento de sementes de diversas espécies agrícolas, principalmente em regiões com baixa precipitação e para culturas muito sensíveis à seca. A ideia é fornecer células da bactéria para tratamento de sementes.

“Por enquanto, só existe esta investigação sobre esta tecnologia em agricultura tropical, a qual, de fato, sofre maior impacto da seca”, ressalta o investigador da Embrapa Itamar Melo, que realizou o estudo. A inspiração para o trabalho veio da natureza. As xerófitas, plantas adaptadas a climas semiáridos e desérticos, associam-se a microrganismos que as auxiliam a desenvolver mecanismos de proteção celular contra o stress hídrico. A ideia é utilizar essas bactérias nas culturas comerciais que, devido às mudanças climáticas, tendem a sofrer cada vez mais com a redução da oferta de água. Os microrganismos hidratam raízes ou interferem na fisiologia dos vegetais que, desse modo, resistem mais ao stress hídrico.

A seca é o fator ambiental limitante ao crescimento das plantas e um dos fenómenos naturais que mais impactam a produtividade agrícola. A resposta da planta ao stress hídrico é complexa, envolvendo uma coordenação entre expressão genética e a sua integração com as hormonas. Uma das respostas mais importantes ao stress é o chamado ajustamento osmótico, que consiste na acumulação de solutos pelas células permitindo que a planta absorva água sem perder turgidez, a consistência que lhe confere rigidez.

Os estudos da Embrapa indicaram potencial de bactérias que atuam nesse mecanismo em mitigar os efeitos do stress hídrico além de propiciar maior promoção do crescimento dessas espécies vegetais. Os resultados sugerem que essas rizobactérias têm forte impacto em vários mecanismos de tolerância ao stress, os quais, em conjunto, resultam na melhoria dos processos das células que atuam para mitigar o stress.

Um desses mecanismos é a produção de osmólitos compatíveis, pequenas moléculas orgânicas selecionadas para contrabalançar stresse ambiental em organismos vivos, como betaína e a formação de biofilmes. O investigador Itamar Melo explica que esses biofilmes são formados pelas rizobactérias. “Eles são agregados multicelulares que aderem à superfície das raízes por meio da produção de substâncias,como os polissacarídeos, proteínas e ADN,” detalha.

Como funciona o mecanismo

Melo conta que as bactérias tolerantes à seca, ao colonizarem o sistema radicular das plantas sob stress abiótico, produzem substâncias que hidratam as raízes, chamadas exopolissacarídeos. Para que os microrganismos cheguem às plantas, é feito um procedimento simples na hora de plantar, conforme explica o cientista: “essas bactérias são misturadas na sementes na altura da plantação, numa suspensão líquida, que pode ser água”, detalha o cientista.

Células bacterianas são desenvolvidas em laboratório e imobilizadas em matrizes de alginato para tratamento de sementes de diferentes espécies vegetais. Isso quer dizer que essas bactérias podem ser produzidas normalmente em fermentadores convencionais, cujas células são usadas para o tratamento de sementes.

Bactérias da Caatinga

A Caatinga, bioma exclusivamente brasileiro, inserido no clima Semiárido nordestino, apresenta plantas xerófitas com alta resistência aos períodos de seca. Estas plantas associam-se a microrganismos que também se encontram bem adaptados, desenvolvendo mecanismos de proteção celular contra o estresse hídrico, assim como proteção vegetal contra os efeitos negativos da dessecação.

O estudo procurou compreender as bactérias associadas às cactáceas da Caatinga, analisando a estrutura das comunidades bacterianas de solo e da rizosfera de Cereus jamacaru durante a alteração do período chuvoso para o de seca, identificando os grupos dominantes e discutindo algumas funções que possibilitem a manutenção da interação solo-cacto-microrganismo durante o período de seca.

Além disso, procurou selecionar bactérias tolerantes à seca e que fossem capazes de promover crescimento de plantas sob stress hídrico. Amostras foram recolhidas ao longo da Caatinga, em cinco estados: Bahia, Ceará, Piauí, Paraíba e Rio Grande do Norte. Com o uso de metodologias independentes de cultivo, foi possível observar que o período de amostragem, chuvoso ou seca, foi o principal responsável pela alteração na estrutura das comunidades bacterianas.

“Entretanto, do laboratório ao campo há um longo caminho a ser percorrido. Já sequenciámos e anotamos parcialmente o genoma de um isolado bastante promissor que apresentou características em seu genoma como produção de aminoácidos e exopolissacarídeos que podem auxiliar na proteção contra os efeitos negativos impostos pelo stress hídrico.

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