publicado a: 2020-06-12

Zangões Mordem Plantas Para Que Floresçam Mais Cedo - Surpreendendo Cientistas

Não se sabe exatamente como é que este processo funciona, mas se for passível de ser replicado pelos humanos, pode beneficiar a agricultura.

Os zangões não andam apenas à deriva nos nossos jardins. Estão ativamente a avaliar as plantas, determinando quais são as flores que têm mais néctar e pólen, e deixam para trás marcas odoríferas que lhes assinalam quais são as flores que já visitaram.

Agora, um novo estudo revela que os zangões forçam as plantas a florescer através de pequenas incisões nas suas folhas – uma descoberta que surpreendeu os cientistas especializados em abelhas.

“Uau! Foi a minha primeira reação”, diz Neal Williams, biólogo de abelhas da Universidade da Califórnia, em Davis. “Depois, fiquei a pensar, como é que não reparámos nisto? Como é que ninguém se apercebeu disto antes?”

Consuelo De Moraes, ecologista química do Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Zurique, teve a mesma reação quando uma das suas alunas, Foteini Pashalidou, reparou que os zangões estavam a fazer pequenas incisões nas folhas das plantas da sua estufa. Os insetos não pareciam estar a transportar pedaços de folhas para os seus ninhos ou a ingeri-los.

Suspeitando que as abelhas estavam a induzir as plantas a florescer, a equipa preparou uma série de experiências. Os resultados mostram que, quando as fontes de pólen são escassas, seja numa estufa ou na natureza no início da primavera, os zangões conseguem forçar as plantas a florescer até um mês mais cedo do que o normal.

Esta investigação é promissora por dois motivos. Por um lado, sugere que os zangões manipulam as flores, uma capacidade particularmente útil, já que o aquecimento global está a fazer com que os polinizadores surjam antes de as plantas florescerem. Estes insetos dependem quase exclusivamente do pólen para se alimentarem a si e às suas larvas no início da primavera.

Por outro lado, também pode potenciar o abastecimento de alimentos para os humanos: isto se os agricultores conseguirem coagir as suas culturas a florescerem mais cedo, podendo aumentar os níveis de produção de algumas plantas.

Mestres jardineiros
Para o estudo, De Moraes, Pashalidou – autora principal do estudo – e os seus colegas colocaram plantas de tomate e de mostarda-preta sem flor em gaiolas de malha com colónias de zangões desprovidas de pólen. Depois, retiraram as plantas quando as abelhas obreiras fizeram entre cinco a dez furos nas folhas das plantas.

De acordo com o estudo, publicado no dia 22 de maio na Science, as pequenas incisões fizeram com que as plantas de mostarda-preta florescessem duas semanas mais cedo do que o habitual, e os tomates um mês antes do normal.

Os cientistas também colocaram colónias de abelhas – umas alimentadas com pólen e outras privadas de pólen – em gaiolas de malha com plantas sem flor para compararem os seus comportamentos. As abelhas obreiras das colónias alimentadas raramente danificaram as plantas, enquanto que as das colónias privadas de pólen fizeram-no atarefadamente.

Em finais de março de 2018, para garantir que os resultados não se deviam às condições artificiais do laboratório, os cientistas colocaram colónias de abelhas e uma variedade de espécies de plantas sem flor no telhado do instituto de Zurique.

As abelhas – de uma espécie comum na Europa – tinham liberdade para procurar comida onde quisessem. No entanto, começaram por danificar as folhas de todas as plantas sem flor mais perto das suas colmeias. O interesse das abelhas nesta atividade diminuiu em finais de abril, à medida que havia mais flores a brotar nas redondezas – estabelecendo novamente que o comportamento das abelhas era impulsionado pela disponibilidade de pólen, dizem os cientistas.

A equipa continuou com as experiências no telhado até julho, e descobriu que as obreiras selvagens de outras duas espécies de abelhas (B. lapidgrius e B. lucorum) foram ao canteiro das plantas sem flor para perfurar as folhas.

Falta saber de que forma este comportamento é difundido em outros zangões, dado que existem mais de 250 espécies pelo mundo inteiro, dizem os autores.

Decifrar o código
A relação mutuamente benéfica entre os insetos polinizadores e as flores remonta até há cerca de 130 milhões de anos. As plantas fornecem comida aos polinizadores e, em troca, os polinizadores fertilizam as suas flores.

Mas nenhuma das partes beneficia se estiverem dessincronizadas uma da outra, pelo que parecem ter encontrado formas de comunicar.

“É o que este estudo demonstra”, diz Lars Chittka, ecologista comportamental da Universidade Queen Mary de Londres, que escreveu uma dissertação que acompanha o artigo da Science. “De certo modo, as abelhas estão a sinalizar que precisam de comida. Estão a pedir para as plantas acelerarem o processo de floração e que em troca serão polinizadas.”

“É um tipo muito sofisticado de comunicação”, acrescenta Santiago Ramirez, ecologista químico da Universidade da Califórnia, em Davis, que não participou no estudo. “Parece que as abelhas decifraram o código que faz com que as plantas floresçam.”

Mas ainda existem muitas questões por responder. Porque é que as incisões fazem com que as plantas floresçam?

Chittka acrescenta: “Será que uma floração antecipada dá origem a um estado mais aprimorado das plantas – ou seja, será que produzem mais?”

Um impulso para a agricultura?
Quando os autores do estudo usaram uma pinça de metal e uma lâmina para imitar as incisões feitas pelas abelhas, as plantas floresceram mais cedo do que o normal, mas não tão cedo como acontece com as abelhas.

“As abelhas fazem algo que ainda não conseguimos realmente capturar”, diz um dos coautores do estudo, Mark Mescher, ecologista evolucionário do mesmo instituto suíço. “Pode ser que introduzam uma pista bioquímica ou de odor de uma glândula salivar. Esperamos conseguir descobrir o que está a acontecer.”

Se o conseguirem, é possível que se abram novas possibilidades para os humanos no cultivo de plantas, e pode potencialmente gerar um impulso na agricultura.

Para os especialistas em abelhas, uma das grandes maravilhas do estudo prende-se com o facto de este ter começado com uma simples observação à moda antiga.

“Charles Darwin seguia zangões por todo o lado”, diz Williams. “E qualquer pessoa interessada em zangões é capaz de ter passado horas a observar o seu comportamento com as flores. Mas provavelmente ninguém o fez com as plantas que não estavam em floração.”

Pashalidou fez exatamente isso – e revelou um fenómeno completamente novo para os nossos olhos.

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