publicado a: 2017-03-01

Os prejuízos também são uma praga. Quem acode aos agricultores?

As contas são dolorosas. Algumas resultam em menos 50 mil euros de produção. Os agricultores levam as mãos à cabeça mas as soluções estão longe da vista e do coração. A agricultura é a base da economia de alguns concelhos, o que acontece quando as pragas são incontroláveis?

No norte do país, bem junto ao Douro, há um concelho cheio de agricultores a roer as unhas. Em Resende, famílias inteiras dependem da produção de cereja e, no mês de junho, milhares de pessoas deslocam-se todos os anos ao Festival dedicado àquele fruto. Mas no ano passado “quase não houve cereja”, garante Alípio da Fonseca. O produtor de cereja da velha guarda do concelho resendense diz sentir-se “frustrado”.

A produção do ano passado sofreu uma queda de 50%. “Estamos todos em pânico a tentar perceber como é que se pode lidar com isto”. As previsões, segundo os que trabalham a terra todos os dias, é que este ano a praga da Drosophila Suzukii irá ser ainda pior. A mosca oriunda do Japão que destrói tudo o que é cultura de pequenos frutos chegou para ficar. Alípio tem, no entanto, esperança que o inverno tenha estado do lado dos que produzem cereja. “O inverno cá em cima foi frio e ela pode ser que esteja mais fraca este ano. Eu tenho as armadilhas expostas e ela não está a cair, tudo indica que está adormecida”.

Elizabete Figueiredo, professora do Instituto Superior de Agronomia, explica que os meios de proteção preventivos assumem maior relevância nesta praga. A utilização de armadilhas (dispositivo e isco) poderá ser utilizada para captura em massa e, combinada com os cuidados essenciais de manutenção da cultura, nomeadamente retirada de frutos maduros e a limpeza do solo, deverá produzir resultados. Segundo a docente, o grande problema no combate a esta praga é o facto de não existirem comportamentos generalizados por parte de todos os produtores no que toca à proteção das culturas com meios de prevenção: “Enquanto não se mudar a forma de negócio com que os produtores lidam com os seus trabalhadores, em que passem a ser pagos não só pelas horas de trabalho / peso do fruto, mas sim sobre a qualidade do fruto que apanham, isto não vai mudar”.

“Vendeu-se cereja espanhola em vez da nossa” Alípio da Fonseca tem sido muito ativo na procura de respostas para combater a Drosophila Susukii e sente-se revoltado por os produtos fitofarmacêuticos homologados para o combate à praga, em Portugal, chegarem sempre atrasados em comparação com os outros países da União Europeia. “Estes não são eficientes. Nós já somos pobres, mas se nos dificultam a luta contra este tipo de prejuízos, fica muito difícil conseguirmos trabalhar. No ano passado vendeu-se cereja espanhola em vez de se vender a nossa, eles tem produtos homologados que a União Europeia permite e nós não, e ninguém percebe porquê”.

A associação Douro Dinâmico chegou a enviar um pedido de autorização para aplicação dos outros produtos ainda não homologados em Portugal, mas este foi recusado pelas entidades.

João Machado, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal, explica que o facto da União Europeia reduzir a lista de fitofármacos permitidos no combate às pragas dificulta em muito a vida dos produtores portugueses. E quando abordado sobre as homologações do nosso país, afirma: “Este é sem dúvida um problema. As homologações em Portugal acabam sempre atrasadas porque somos um país pequeno e a nível de concorrência estamos sempre em desvantagem”.

Quem paga os prejuízos? Alípio sente que nada é feito pelos produtores. No último ano, o prejuízo final da produção de cereja do agricultor de Resende foi de 50 mil euros. Elisabete Figueiredo avisa que, normalmente, este tipo de prejuízos não são protegidos por seguros: “Quem nos dera que os seguros ajudassem com as crises climatéricas, quanto mais falar nas pragas...”.

João Machado afirma porém que “tudo depende da cultura de que se está a falar, porque há seguros que cobrem prejuízos relacionados com pragas agrícolas, ainda que não exista nenhum específico para as mesmas”. Para Machado, as pragas activas em Portugal são já suficientemente antigas e estão estáveis há tempo suficiente para que os danos provocados possam ser previsíveis.

A presidente da Douro Dinâmico, Alexandra Janela Pires, por seu turno, revela-se preocupada. A engenheira teme que os agricultores possam “no meio do desespero, usar produtos ilegais para o combate a este tipo de inimigos”. Mas a verdade é que “ninguém sabe como ganhar esta luta”. Haverá alguém que os acuda?

Fonte: Sol

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