CNA: Balanço do ano agrícola 2020
Pandemia e falta de políticas adequadas agravam situação da Agricultura Familiar
Ao iniciar um novo ano, a CNA sublinha as dificuldades acrescidas que em 2020 se abateram sobre a Agricultura Familiar, devido à pandemia de COVID-19 e às já crónicas más opções políticas do Governo e do Ministério da Agricultura, penalizadoras da Produção Nacional, do Mundo Rural e da Soberania Alimentar do País.
Com a pandemia, as limitações à circulação de pessoas e produções expuseram as fragilidades do sistema alimentar dominante baseado no comércio internacional. A necessidade de garantir comida nas mesas de um País escandalosamente dependente do exterior em bens agro-alimentares (p. ex. cereais, carne ou componentes para rações…) catapultou para a opinião pública a importância dos Agricultores e da Produção Nacional para consumo no País.
Contudo, as políticas definidas pelo Governo e por Bruxelas continuam focadas na grande Agricultura, mais intensiva, mais concentrada, e também mais privilegiada, alegadamente com capacidade e vocação exportadora, negligenciando e prejudicando a Agricultura Familiar e os pequenos e médios agricultores que abastecem o mercado interno.
A grande diminuição da actividade da restauração e hotelaria e a opção inicial de decretar o encerramento de feiras e mercados de proximidade – tentativa que o Governo quis repetir em Novembro – penalizaram fortemente a Agricultura Familiar. Ao mesmo tempo, permaneciam abertas grandes superfícies comerciais que se aprontaram a fazer publicidade e a especular com os preços dos alimentos, à custa de Agricultores e consumidores. Mas foi também graças à contestação da CNA que se mantiveram abertos ou reabriram mercados e feiras, repondo-se assim mais justiça no direito dos consumidores a uma alimentação de qualidade.
Logo no início da pandemia, que coincidiu com o período da Páscoa, no sector da Pecuária os animais e os lacticínios (queijo) ficaram por vender, as colheitas apodreceram, literalmente, nos campos e outras culturas ficaram atrasadas ou mesmo por fazer.
A pandemia, por um lado, e as importações desnecessárias de bens agro-alimentares, por outro, contribuíram para que se tenham mantido dificuldades no escoamento e preços baixos, em produções como o azeite tradicional, leitões, borrego, cabrito, carne bovina, queijos, vinho, mel e várias frutas e hortícolas, entre outros. Situação que inclui a madeira e alguns dos seus derivados.
A CNA, sempre em contacto com os Agricultores e as suas organizações, intensificou contactos institucionais com propostas em defesa da Produção Nacional e do rendimentos das Explorações Agro-Alimentares.
Da parte do Governo, as ajudas para minimizar os prejuízos foram insuficientes. Num ano muito penalizador para quem trabalha, destacamos positivamente, e resultado da luta da Agricultura Familiar, o aumento do valor do Regime Pequena Agricultura, de 600€ para 850€ por ano, que nos incita a lutar, porque é justo, por um aumento para 1250€, valor permitido pelos Regulamentos.
Os dados divulgados em Dezembro pelo Instituto Nacional de Estatística confirmam a penalização da Agricultura Familiar: menos 15,5 mil explorações agrícolas nos últimos dez anos e diminuição do rendimento proveniente da Agricultura. Isto numa situação em que o rendimento dos Agricultores portugueses já era apenas metade do rendimento médio dos demais cidadãos.O ano encerrou também sem avanços significativos na concretização do Estatuto da Agricultura Familiar, instrumento que devidamente implementado poderá contribuir para inverter o ritmo de encerramento de explorações, a desvalorização do rendimento dos Agricultores e a desertificação humana do interior. O Orçamento do Estado para 2021 é o terceiro desde a consagração legal do Estatuto (em Agosto 2018) a não contemplar as verbas para a sua implementação. É uma situação lamentável e que não se pode manter!
Não se concretizaram também em 2020 medidas para solucionar a dramática situação vivida pelos Agricultores que por todo o País vêem as suas culturas destruídas por javalis e outros animais selvagens e para as explorações atingidas por incêndios e intempéries. Espécies invasoras, como a vespa asiática, vão alastrando no território sem controlo capaz de minimizar o seu impacto sobre as abelhas e sobre a produção de mel.
São muitos os problemas que afectam a Agricultura Familiar, uma Agricultura que ocupa o território, garante e protege a agro-biodiversidade e o Ambiente, produz grande parte da alimentação que abastece o mercado interno e os mercados de proximidade, com produtos de qualidade e culturalmente adequados. São necessárias outras e melhores políticas agro-rurais para defender a Produção Nacional e a Soberania Alimentar do País.
Presidência Portuguesa da UE em 2021 e encerramento das negociações da PAC
Portugal assume no primeiro semestre deste ano a Presidência da União Europeia, período em que deverão ser encerradas as negociações para a definição da Política Agrícola Comum (PAC) para os anos 2021-2027.
As negociações começaram mal com cortes orçamentais face ao anterior Quadro Financeiro Plurianual e continuam com más opções que não irão ajudar a resolver os problemas e os desafios que se colocam aos Agricultores, aos cidadãos e ao planeta.
A concretizar-se como se perspectiva, a nova PAC irá provocar mais assimetrias e concentração da propriedade, já que medidas como o pagamento redistributivo e a modulação e limites de pagamento (plafonamento) continuam opcionais para os Estados-Membro e sem aplicação efectiva. Acresce que a opção de Portugal adoptar já a uniformização dos pagamentos por hectare pode levar a perdas significativas nas ajudas nas regiões de minifúndio, zonas de montanha e em sectores como a carne e o leite. A presidência da UE deveria constituir uma oportunidade para o Ministério da Agricultura alterar esta questão e não para “pôr o carro à frente dos bois” ao decidir aplicar um mecanismo que prejudica as explorações de menor dimensão e que ainda se encontra em discussão ao nível da UE.
Faltam também instrumentos e políticas de regulação de mercado para assegurar escoamento a preços justos de uma produção saudável e sustentável e a garantia de que as ajudas são atribuídas, exclusivamente, a quem produz.
A CNA, como sempre tem feito, continuará a apresentar propostas para uma PAC mais justa, com uma redistribuição do apoio público a dar prioridade a modelos que se baseiem nos pequenos e médios Agricultores da Agricultura Familiar e nos princípios da Soberania Alimentar.
A CNA reclama ao Governo Português que salvaguarde convenientemente o interesse nacional nas negociações sobre a Reforma da PAC durante a Presidência da UE.
Um comunicado: