publicado a: 2021-01-08

CNA: Balanço do ano agrícola 2020

Pandemia e falta de políticas adequadas agravam situação da Agricultura Familiar

Ao iniciar um novo ano, a CNA sublinha as dificuldades acrescidas que em 2020 se abateram sobre a Agricultura Familiar, devido à pandemia de COVID-19 e às já crónicas más opções políticas do Governo e do Ministério da Agricultura, penalizadoras da Produção Nacional, do Mundo Rural e da Soberania Alimentar do País.

Com a pandemia, as limitações à circulação de pessoas e produções expuseram as fragilidades do sistema alimentar dominante baseado no comércio internacional. A necessidade de garantir comida nas mesas de um País escandalosamente dependente do exterior em bens agro-alimentares (p. ex. cereais, carne ou componentes para rações…) catapultou para a opinião pública a importância dos Agricultores e da Produção Nacional para consumo no País.

Contudo, as políticas definidas pelo Governo e por Bruxelas continuam focadas na grande Agricultura, mais intensiva, mais concentrada, e também mais privilegiada, alegadamente com capacidade e vocação exportadora, negligenciando e prejudicando a Agricultura Familiar e os pequenos e médios agricultores que abastecem o mercado interno.

A grande diminuição da actividade da restauração e hotelaria e a opção inicial de decretar o encerramento de feiras e mercados de proximidade – tentativa que o Governo quis repetir em Novembro – penalizaram fortemente a Agricultura Familiar. Ao mesmo tempo, permaneciam abertas grandes superfícies comerciais que se aprontaram a fazer publicidade e a especular com os preços dos alimentos, à custa de Agricultores e consumidores. Mas foi também graças à contestação da CNA que se mantiveram abertos ou reabriram mercados e feiras, repondo-se assim mais justiça no direito dos consumidores a uma alimentação de qualidade.

Logo no início da pandemia, que coincidiu com o período da Páscoa, no sector da Pecuária os animais e os lacticínios (queijo) ficaram por vender, as colheitas apodreceram, literalmente, nos campos e outras culturas ficaram atrasadas ou mesmo por fazer.

A pandemia, por um lado, e as importações desnecessárias de bens agro-alimentares, por outro, contribuíram para que se tenham mantido dificuldades no escoamento e preços baixos, em produções como o azeite tradicional, leitões, borrego, cabrito, carne bovina, queijos, vinho, mel e várias frutas e hortícolas, entre outros. Situação que inclui a madeira e alguns dos seus derivados.

A CNA, sempre em contacto com os Agricultores e as suas organizações, intensificou contactos institucionais com propostas em defesa da Produção Nacional e do rendimentos das Explorações Agro-Alimentares.

Da parte do Governo, as ajudas para minimizar os prejuízos foram insuficientes. Num ano muito penalizador para quem trabalha, destacamos positivamente, e resultado da luta da Agricultura Familiar, o aumento do valor do Regime Pequena Agricultura, de 600€ para 850€ por ano, que nos incita a lutar, porque é justo, por um aumento para 1250€, valor permitido pelos Regulamentos.

Os dados divulgados em Dezembro pelo Instituto Nacional de Estatística confirmam a penalização da Agricultura Familiar: menos 15,5 mil explorações agrícolas nos últimos dez anos e diminuição do rendimento proveniente da Agricultura. Isto numa situação em que o rendimento dos Agricultores portugueses já era apenas metade do rendimento médio dos demais cidadãos.

O ano encerrou também sem avanços significativos na concretização do Estatuto da Agricultura Familiar, instrumento que devidamente implementado poderá contribuir para inverter o ritmo de encerramento de explorações, a desvalorização do rendimento dos Agricultores e a desertificação humana do interior. O Orçamento do Estado para 2021 é o terceiro desde a consagração legal do Estatuto (em Agosto 2018) a não contemplar as verbas para a sua implementação. É uma situação lamentável e que não se pode manter!

Não se concretizaram também em 2020 medidas para solucionar a dramática situação vivida pelos Agricultores que por todo o País vêem as suas culturas destruídas por javalis e outros animais selvagens e para as explorações atingidas por incêndios e intempéries. Espécies invasoras, como a vespa asiática, vão alastrando no território sem controlo capaz de minimizar o seu impacto sobre as abelhas e sobre a produção de mel.

São muitos os problemas que afectam a Agricultura Familiar, uma Agricultura que ocupa o território, garante e protege a agro-biodiversidade e o Ambiente, produz grande parte da alimentação que abastece o mercado interno e os mercados de proximidade, com produtos de qualidade e culturalmente adequados. São necessárias outras e melhores políticas agro-rurais para defender a Produção Nacional e a Soberania Alimentar do País.

Presidência Portuguesa da UE em 2021 e encerramento das negociações da PAC

Portugal assume no primeiro semestre deste ano a Presidência da União Europeia, período em que deverão ser encerradas as negociações para a definição da Política Agrícola Comum (PAC) para os anos 2021-2027.

As negociações começaram mal com cortes orçamentais face ao anterior Quadro Financeiro Plurianual e continuam com más opções que não irão ajudar a resolver os problemas e os desafios que se colocam aos Agricultores, aos cidadãos e ao planeta.

A concretizar-se como se perspectiva, a nova PAC irá provocar mais assimetrias e concentração da propriedade, já que medidas como o pagamento redistributivo e a modulação e limites de pagamento (plafonamento) continuam opcionais para os Estados-Membro e sem aplicação efectiva. Acresce que a opção de Portugal adoptar já a uniformização dos pagamentos por hectare pode levar a perdas significativas nas ajudas nas regiões de minifúndio, zonas de montanha e em sectores como a carne e o leite. A presidência da UE deveria constituir uma oportunidade para o Ministério da Agricultura alterar esta questão e não para “pôr o carro à frente dos bois” ao decidir aplicar um mecanismo que prejudica as explorações de menor dimensão e que ainda se encontra em discussão ao nível da UE.

Faltam também instrumentos e políticas de regulação de mercado para assegurar escoamento a preços justos de uma produção saudável e sustentável e a garantia de que as ajudas são atribuídas, exclusivamente, a quem produz.

A CNA, como sempre tem feito, continuará a apresentar propostas para uma PAC mais justa, com uma redistribuição do apoio público a dar prioridade a modelos que se baseiem nos pequenos e médios Agricultores da Agricultura Familiar e nos princípios da Soberania Alimentar.

A CNA reclama ao Governo Português que salvaguarde convenientemente o interesse nacional nas negociações sobre a Reforma da PAC durante a Presidência da UE.

Um comunicado:

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