publicado a: 2018-11-03

Brasil: crise política e instabilidade cambial quebram exportações de pêra rocha

Passou uma semana sobre as eleições no Brasil, mas a instabilidade política, económica e cambial está a ensombrar o consumo interno há meses. E, por consequência, as exportações portuguesas de frutas, em particular de pêra rocha.

“O consumo de frutas e legumes baixou 40% nos últimos oito meses” naquele país, lembrou, em Madrid, o dirigente da Portugal Fresh e administrador da LusoPêra, João Alves. “O real atingiu valores cambiais incomportáveis e, este ano, isso foi altamente penalizador para as transações” comerciais entre Portugal e o Brasil. Um país onde as frutas chegam facilmente – “a pêra viaja muito bem e tem um excelente comportamento na prateleira” –, mas onde “há pouco dinheiro e pouca capacidade aquisitiva”.

S. Paulo “é o grande alvo” das vendas da LusoPêra e onde “o consumo é mais forte”. Depois é “o Rio de Janeiro, mas também no Nordeste”. Mas a pêra rocha de Portugal “é também rainha em Santa Catarina e Florianópolis [capital do estado brasileiro de Santa Catarina, no Sul do país]”. “Estamos muito dependentes daquele mercado”, admite João Alves, preocupado com a atual situação política, económica e social do Brasil.

A ANP - Associação Nacional de Produtores de Pêra Rocha partilha desta preocupação. “É o nosso primeiro mercado de exportação; do total das vendas, nacionais e para o estrangeiro, as exportações para o Brasil representam 30%, mas se nos focarmos apenas nas exportações, o Brasil representa 60% da fruta exportada”, diz o presidente da Associação, Domingos Santos.

“A situação económica, está muito difícil, mais a instabilidade política associada à deflação da moeda e ao câmbio desfavorável, faz com que a pêra rocha chegue àquele mercado a um preço que a população não consegue comprar”, lamenta o empresário.

A atual campanha da pêra rocha – cuja produção, este ano, sofreu quebras próximas de 25% devido ao calor e caiu para as 180 a 190 mil toneladas, abaixo das 210 mil do ano passado – ainda vai com apenas dois meses de exportações. É, portanto, “cedo para avaliar, com números”, as vendas para aquele mercado sul-americano. Mas Domingos Santos está pessimista. “Vai haver quebra de certeza”, diz.

Espanha é “o mais importante cliente das frutas e legumes nacionais”

Gonçalo Andrade, presidente da associação Portugal Fresh, também está cético. Ciente de que a pêra rocha é a fruta portuguesa “com mais expressão para o Brasil”, acredita, contudo, que “as ligações que existem entre o Brasil e Portugal são muito boas”. Isto, embora “o peso da queda da moeda” nas transações possa afetar as exportações. Mas isto, diz, “Portugal não pode controlar”, porque “não conseguimos passar essas barreiras”.

Questionado sobre o facto de a instabilidade política poder derivar numa quebra do consumo e, por essa via, levar ao decréscimo das exportações portuguesas, nomeadamente de frutas, Gonçalo Andrade espera que tal “não aconteça”. “Há uma revolta muito grande do povo brasileiro e espero sinceramente que o país consiga ultrapassar esta fase e que, acima de tudo, não se cortem pontes de entendimento nem uma longa história comum e que o Brasil não caia numa retração de mercado”. O presidente da Portugal Fresh deixa mesmo um apelo: “não vamos ser tão pessimistas; a situação é muito complicada, mas vamos acreditar que vamos conseguir ultrapassar”.

A Portugal Fresh – Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores participou, pelo 8º ano consecutivo, na Fruit Attraction de Madrid, uma das maiores feiras mundiais de frutas e legumes. No total, 42 empresas, associações e parceiros mostraram aos 70 mil visitantes de 120 países o que de melhor se produz em Portugal.

Espanha, com 47 milhões de habitantes, é o maior parceiro comercial de Portugal e o mais importante cliente das frutas e legumes nacionais. Em 2017, as vendas desta fileira ao mercado espanhol totalizaram 450 milhões de euros, mais 13,6% do que no ano anterior (396 milhões). O objetivo dos produtores é atingir a fasquia dos 500 milhões de euros.

As exportações do setor, entre janeiro e julho de 2018, quebraram 1% face ao período homólogo de 2017 (de 948 milhões de euros para 939 milhões). A seca prolongada e as posteriores chuvas tardias da primavera e verão atrasaram o início das campanhas e prejudicaram o valor médio de venda de grande parte dos produtos hortofrutícolas portugueses. Ainda assim, a Portugal Fresh mantém o objetivo: chegar aos 2000 milhões de euros de exportações em 2020.

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