publicado a: 2018-12-09

O Programa de Valorização do Interior

António Covas, em mais uma Crónica do Sudoeste Peninsular, analisa o Programa de Valorização do Interior

O Programa do XXI Governo Constitucional afirmou a valorização do território e a dinamização do interior como uma das prioridades da ação governativa.

O Programa do Governo apostou nas regiões de fronteira como nova centralidade no mercado ibérico, através do desenvolvimento das cidades médias, da cooperação transfronteiriça e do repovoamento e redinamização dos territórios de baixa densidade, bem como na valorização da pequena agricultura e na reforma da floresta.

Por forma a impulsionar os seus objetivos nesta matéria, o Programa do Governo propôs a criação de “uma unidade de missão para a valorização do interior, na dependência direta do Primeiro-Ministro, tendo como responsabilidades criar, implementar e supervisionar um programa nacional para a coesão territorial, bem como promover o desenvolvimento do território do Interior”.

A Unidade de Missão para a Valorização do Interior (UMVI) veio a ser criada logo em dezembro de 2015, através da Lei Orgânica do Governo, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 251-A/2015, de 17 de dezembro, tendo elaborado o Programa Nacional para a Coesão Territorial (PNCT), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2016, de 24 de novembro. Desde junho de 2017, a UMVI tem sede em Pedrógão Grande.

O PNCT aprovou a execução de 164 medidas destinadas à valorização do Interior, agrupadas em cinco eixos: um território interior Mais Coeso, Mais Competitivo, Mais Sustentável, Mais Conectado e mais Colaborativo.

O PNCT e as medidas que o compõem correspondem a compromissos que o Governo e as várias áreas de governação que o integram têm vindo a executar de forma determinada.

Decorridos quase dois anos de implementação do PNCT, e realizado o respetivo balanço quanto ao grau de execução das medidas, os resultados alcançados apresentam uma taxa de execução elevada, com 79 % das medidas executadas ou em vigor e 10 % das medidas em curso, sendo essa taxa particularmente relevante no eixo estratégico 2, um território interior Mais Competitivo, com uma taxa de execução de 87 %.

Algumas das medidas constantes do PNCT não chegaram, porém, a ser concretizadas e foram ultrapassadas, em razão, designadamente, das regras relativas ao pacote da descentralização, que justifica que a reorganização da administração desconcentrada do Estado se efetue no quadro mais genérico preconizado. Outras medidas, como a criação do Banco de Terras, não tiveram acolhimento legislativo.

Sabemos que a coesão territorial e a correção dos desequilíbrios regionais são tarefas de longo prazo, que a inversão de tendências estruturais de décadas não ocorre no curto prazo ou com base na concretização de fórmulas simples. Mas neste momento a coesão territorial e o desenvolvimento do interior são causas nacionais que mobilizam toda a comunidade.

É nesse sentido que se aprovam 65 medidas adicionais, tendo em vista a intensificação de três grandes opções estratégicas para o desenvolvimento do interior, a integrar o programa, que passa de ora em diante a designar-se por Programa de Valorização do Interior.

Em primeiro lugar, a importância da atração de investimento que crie emprego e que permita fixar populações. Para se contrariarem as tendências de abandono do território e envelhecimento, é necessário assegurar saldos migratórios positivos, o que exige a retenção da população ativa e a atração de novos residentes. O esforço da atração de investimento exige contrariar as tendências naturais do mercado.

Por isso, aposta-se na criação de programas específicos no âmbito do PT2020, especialmente vocacionados para a criação de emprego, que permitam assegurar o apoio exclusivo a investimentos destinados aos territórios do interior; em programas específicos no setor do turismo; na valorização dos recursos endógenos, através da aposta na investigação científica e no trabalho entre as empresas e as instituições de ensino superior do interior; na competitividade fiscal dos territórios de baixa densidade, particularmente vinculada ao investimento e à criação de emprego; e na compensação dos custos de contexto para as atividades empresariais, através da redução das portagens para as atividades empresariais e de transporte de mercadorias.

Em segundo lugar, a importância da valorização do capital natural e da manutenção da paisagem. A nova realidade demográfica não pode conduzir ao abandono do território rural, cujas consequências estiveram bem à vista com as tragédias dos fogos florestais de 2017 e que poderia levar a uma degradação irreversível da qualidade ambiental do país num momento em que se enfrenta a ameaça irreversível das alterações climáticas.

Por isso, dá-se particular atenção à gestão do território, à valorização dos recursos endógenos ou aos apoios à pequena agricultura. Também se aposta no reforço das estruturas do Estado em matéria de gestão do território rural, com o reforço do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas e sua presença desconcentrada.

Em terceiro lugar, a necessidade de promover a equidade no acesso aos serviços públicos pela população dos territórios de baixa densidade, tendo por base uma melhor articulação entre a oferta de serviços urbanos e rurais e uma distribuição mais justa e equitativa dos recursos e das oportunidades no território.

Embora se venham acentuando tendências de concentração da população nos maiores centros urbanos do interior, particularmente das capitais de distrito, continuam a existir aglomerados dispersos, com população cada vez mais escassa e envelhecida que carece de atenção especial.

AS MEDIDAS ADICIONAIS DO PROGRAMA DE VALORIZAÇÃO DO INTERIOR

Por razões de espaço, vou apenas referir a denominação das medidas mais emblemáticas. Remeto o leitor para a RCM onde é feita uma pequena descrição de cada medida.

– Abertura de novos serviços/organismos públicos no interior.
– Localização dos Arquivos do Estado no Interior.
– Chave na Mão – Programa de Mobilidade Habitacional para a Coesão Territorial.
– Incentivos à mobilidade geográfica no setor público.
– Operações de Desenvolvimento Prioritário (Pinhal Interior e Douro Internacional).
– Cadastro Simplificado – Programas de Apoio Financeiro Público.
– Centros de Informação Cadastral Simplificada.
– Tarifa Solidária – GPL.
– Estruturas de formação das forças de segurança e proteção civil no Interior.
– Localização de estruturas militares de apoio e formação no Interior.
– Rede de Escolas Profissionais Agrícolas e de Desenvolvimento Rural do Interior.
– Alargamento da rede dos Centros de Competências TIC no Interior.
– Alargamento do projeto Comunidades de Aprendizagem no Interior.
– Alargamento do Programa Nacional de Educação Estética e Artística
– Alargamento do Programa Escolas Bilingue em Inglês ao Interior.
– Programa de Itinerância ou de Cedência de Obras de Arte.
– Polos Regionais de Museus Nacionais.
– Programa de ERASMUS do Mar.
– Programa de Captação de Investimento para o Interior (PC2II).
– IRS – Majoração de despesas dedutíveis à coleta do IRS.
– IRS – Majoração do valor dos encargos e aumento do limite da dedução à coleta.
-IRC – Redução do IRC em função dos postos de trabalho criados no Interior.
– IRC – Reforço de benefícios fiscais contratuais no Interior.
– IRC – Reforço de benefícios fiscais ao investimento no Interior.
– PT 2020/SI – Programa de Apoio para os territórios do Interior.
– Linha de Desenvolvimento Local e Valorização do Interior.
– Desenvolvimento de dinâmicas de mercado social de emprego.
– Espaço Empresa: Rede Nacional de Apoio às Empresas e ao Investimento.
– Ciclo de Conferências sobre o financiamento às empresas e internacionalização.
– Centro de Competências da Floresta.
– Laboratório Colaborativo para o Pinhal.
– Laboratório de processamento e Visualização de Dados/Centro de inteligência.
– Mapa do Comércio, Serviços e Restauração.
– Linha de Crédito de Incentivo ao Comércio Local de Proximidade.
– Revisão de taxas das indústrias que se fixem no Interior.
– Regime complementar de redução de taxas – Portagens.
– Reforço do potencial dos recursos geológicos: Lítio.
– Programa de dinamização da atividade de animação turística no Interior.
– Programa de investimento imobiliário no turismo em territórios do Interior.
– Dinamização da rede de FabLabs.
– Promoção e valorização do papel das autarquias do Interior em iniciativas i4.0.
– Programa Avançado de Internacionalização para as empresas do Interior.
– Mostra Nacional dos Recursos dos Territórios do Interior.
– Compras Públicas de Proximidade.
– Formação em Transporte e Segurança na navegabilidade fluvial.
– Plataforma nacional para a Biomassa e Biorefinarias
– Plano Nacional Solar.
– EPDGF – Empresa Pública de Desenvolvimento e Gestão Florestal.
– Estatuto da Agricultura Familiar.
– Revisão da Lei Orgânica do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.
– Rede Escolar dos Geoparques.
– Programa de investimentos nas acessibilidades de proximidade.
– Gestão autárquica do Património Imobiliário do Estado sem utilização.
– Programa BEM – Beneficiação de Equipamentos Municipais.
– Agenda para a Cooperação Transfronteiriça.
– Alargar a cobertura da Rede de Ciência, Tecnologia e Sociedade.
– Navegabilidade fluvial.
– Redistribuição regional de vagas no ensino superior público.
– Plataforma MOVE IN de mobilidade e emprego no Interior
– Territorializar a Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não discriminação
– Promoção da integração das pessoas ciganas no Interior.
– Programa de integração de refugiados/as.
– Novas centralidades de estímulo a atividades de I&D e de difusão da cultura científica.
– Laboratório de Artes de Montanha Graça Morais (LAM-GM).

Nota Final

Pela sua eloquência, as medidas falam por si. Infelizmente, o “método das listas de medidas e o pick and choose” já deram provas suficientes da sua baixa efetividade. Falta quase tudo: um território-desejado, uma ação coletiva inovadora, uma intencionalidade estratégica, uma comissão promotora, um ecossistema social de acolhimento, enfim, o reagrupamento de medidas, a produção de um território-rede e uma curadoria territorial a condizer.

Talvez a medida denominada de “Operação de Desenvolvimento Prioritária” seja a promessa que todos estávamos à espera. Vamos aguardar pelos próximos episódios.

Autor: António Covas é professor catedrático da Universidade do Algarve e doutorado em Assuntos Europeus pela Universidade Livre de Bruxelas

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