publicado a: 2019-04-30

Vem aí a terceira revolução agrícola?

Depois de um século marcado pelo desenvolvimento da mecanização agrícola, a agricultura prepara-se para entrar numa nova era com a introdução de tecnologias de automação e robotização. Menos agroquímicos e maior produtividade deverão ser os ganhos nesta ‘terceira revolução agrícola’. A previsão é de Fréderic Martin, Presidente da Axema – Union des Industriels de l’Agroéquipement – associação envolvida na organização do certame – e resume uma edição do SIMA que pautou pela mostra de inovação.


O mercado global de serviços e tecnologia de robotização para a agricultura deverá atingir um valor de 16,3 mil milhões de euros até 2021. Por outro lado, a generalização da utilização de pulverizadores de precisão poderá permitir uma redução de 30% no uso de fitofarmacêuticos, uma percentagem que pode aumentar para 50% com a introdução de novas tecnologias no mercado. Os números são avançados pelo Presidente da Axema e corroborados pelas empresas que marcaram presença na edição de 2019 do SIMA, que decorreu em Paris entre os dias 24 e 28 de fevereiro.

Mais de 230 mil profissionais do setor estiveram presentes para conhecer as inovações da indústria da mecanização agrícola e com mais de 40 países representados pelas empresas expositoras, o evento voltou a confirmar a sua ‘vocação’ internacional, recebendo visitantes de mais de 140 mercados e 400 delegações internacionais, 473 dos quais de Portugal, um crescimento de 9% face à edição de 2017.

Herculano à conquista dos mercados internacionais

João Montez, Diretor Comercial da Herculano Alfaias Agrícolas, única empresa nacional a marcar presença como expositora na feira, explica que o SIMA é “uma oportunidade para contactar com outras nacionalidades, nomeadamente africanos de língua francesa, que nos abrem outros mercados.”

Com uma faturação de 15 milhões de euros em 2018 e uma previsão de crescimento de 15% para este ano, atualmente, 75% da produção da Herculano é vendida ao mercado de exportação, com Bélgica, França, Espanha, Inglaterra, Bulgária, Austrália, Roménia e Nova Zelândia a distinguirem-se como os principais clientes. É para alargar esta rede que a empresa levou ao SIMA algumas das suas mais recentes inovações.

“Temos novidades essencialmente na preparação de solos, com as grades rápidas, e também na nossa principal área de negócio, que são os reboques e as cisternas. Temos novidades, por exemplo, nos reboques para transporte de pedra. Para além disso, iniciámos há cerca de dois anos um projeto de fertilização inteligente com o INESCT TEC e fizemos os primeiros desenvolvimentos no que diz respeito ao DPA, tanto nos reboques para estrume como também nas cisternas, e agora continuamos a trabalhar porque queremos aperfeiçoarmo-nos muito mais. Queremos ir mais longe em questões como colocar a quantidade certa, no momento certo, e no sítio certo. É uma tendência e nós queremos estar entre os melhores porque temos essa capacidade”, defende João Montez.

Inovação premiada

À semelhança das anteriores edições, “os melhores” em equipamentos, produtos, técnicas e serviços voltaram a ser premiados pelos SIMA Innovation Awards, com três grandes tendências a destacarem-se: a tecnologia digital para a agricultura, com soluções de recolha de dados para apoiar a tomada de decisão; a qualidade da mecanização e a melhoria de performance; e a segurança e a melhoria das condições de trabalho.

As duas Medalhas de Ouro foram entregues à Claas e à LaForge, as cinco Medalhas de Prata foram para a Airbus Defence and Space & John Deere, Bosch France, John Deere, Kuhn e Sodijantes Industrie, e as 20 Medalhas de Bronze foram atribuídas à Amazone, Arbos France, Beiser Envrinnement, Berthoud, Case IH, Claas, Climate Fieldview, De Sangosse & CAP 2020, Hydrokit, Isagri, Jourdain SAS, Karnott, Kverneland Group France SAS, Manitou Group, New Holland Agriculture, Rabaud e Trimble.

Agricultura ‘aumentada’ e de precisão são as grandes tendências

O SIMA 2019 foi ainda uma oportunidade para debater os desafios da agricultura do futuro em vários eventos paralelos que contaram com a presença de alguns dos maiores experts na adoção de tecnologia no setor.

A conferência ‘Agricultura melhorada: uma realidade hoje e amanhã’, organizada pela Agridées, focou-se na forma como as ferramentas digitais estão a ser utilizadas para melhorar os processos de tomada de decisão dos gestores agrícolas, assim como para resolver as necessidades do setor.

Andre Laperriere, Executive Director da Godan, explicou que apesar dos avanços tecnológicos, ainda existe uma “fratura digital” entre o mundo industrializado e os pequenos agricultores que ainda não têm acesso a dados que “podem ajudar a resolver os problemas existentes nas explorações agrícolas”, nomeadamente no que diz respeito a pragas e doenças.

Fatma Bem Rejeb, CEO da Panafrican Farmers’ Organization (PAFO), defendeu que “precisamos de ligar o conhecimento à tecnologia. Existe conhecimento que deve ser valorizado e melhorado com recurso à tecnologia.” Uma ideia apoiada por Fabrizio Delage Paganini, co-fundador da Valeur Tech, que sublinha que “os dados só têm valor se forem processados. É preciso uma abordagem horizontal para levar as pessoas a adotar as novas tecnologias. Para além disso, é preciso tornar os dados mais acessíveis.”

Tomáš Ignac Fenix, Vice-Presidente do CEJA – European Council of Young Farmers, acrescenta que só com melhor acesso aos dados é que será possível acabar com a falta de alimentos nos países em desenvolvimento e reduzir o desperdício alimentar, afirmando que “não precisamos de produzir mais, mas sim de produzir melhor. Produzimos de mais e desperdiçamos de mais. É preciso mudar o ecossistema da agricultura (…) Os agricultores devem estar diretamente envolvidos na investigação de soluções para as suas necessidades. A transparência em relação à origem dos produtos, por exemplo, será uma necessidade crescente e a tecnologia é essencial neste processo. Tecnologias como a Blockchain, por exemplo, podem ser uma solução.”

Philippe Boulet, Director of the Performance and Prospective division da Cerfrance, concluiu referindo que “a reunião da tecnologia e da agricultura precisa de conhecimentos combinados, melhor formação e mais partilha para o desenvolvimento coletivo”.

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