publicado a: 2018-12-03

Adaptação da viticultura às alterações climáticas

Depois de dois anos agrícolas extremamente atípicos, com períodos de seca prolongados, precipitação muito intensa num curto espaço de tempo, e temperaturas máximas nunca antes vistas que queimaram a produção de vários viticultores, há que “aceitar” uma nova realidade climatérica e saber como nos adaptamos para manter Portugal como o extraordinário país que é no panorama dos vinhos mundiais. Temos que saber adequar a viticultura e as práticas vitivinícolas aos três fenómenos em cima mencionados (seca, chuva intensa e altas temperaturas) para obtermos uvas de qualidade.

Durante períodos de seca, a vinha tem que ser “ajudada”. Um plano de rega bem desenhado e um maior número de charcas e barragens, para conseguirmos armazenar água durante os curtos períodos de chuva, podem ser parte da solução. Podemos também apostar em castas autóctones e resistentes à sequia e adaptar os sistemas de condução da vinha para haver uma menor evapotranspiração.

Quanto às chuvas intensas num curto período de tempo, a correta preparação do solo é fundamental para combater a erosão que estas chuvas trazem. Para tal, há que investir numa cobertura vegetal nas vinhas que não seja muito exigente em água e que ajude no combate à erosão. A boa gestão desta cobertura vegetal irá também ajudar a fixar azoto no solo, reduzindo assim a fertilização exagerada das vinhas.

Já o aumento das temperaturas máximas parece trazer problemas igualmente graves e de resolução menos óbvia. Relembrar o nosso último agosto, em que houve termómetros a chegar aos 47ºC e que, com estas temperaturas, fica praticamente impossível para as vinhas produzirem uvas com os níveis de qualidade desejado. Porquê? As vinhas quando sentem demasiado calor fecham os estomas para não transpirarem; ao fecharem os estomas bloqueiam a atividade fotossintética, levando a uma maturação heterogénea das uvas e, como tal, menor acidez das mesmas, o que origina vinhos menos equilibrados. Além de eliminarem alguma acidez, estas altas temperaturas causam também desidratação nas uvas, resultando em perdas significativas de produção. E, em casos extremos como o deste ano, temos o escaldão que, para além de queimar e secar grande parte dos bagos, deixa a outra parte com uma pele menos interessante para a vinificação, pois dá-se a degradação dos polifenóis que estão no revestimento das uvas. O futuro passa por escolher bem a orientação a que plantamos novas vinhas, para evitar a incidência direta dos raios solares nas uvas nas horas mais quentes do Verão, conduzir bem a vinha, para que as folhas protejam os cachos, e pensar em escolher castas de bago grande para aguentarem a desidratação.

A longo prazo, como todos sabemos, a história é outra… Há que pensar em políticas que tenham verdadeiro impacto na redução de emissões de gases para a atmosfera, criar medidas que obriguem a um uso da água de forma mais eficiente e, claro, cativar e atrair inovação para o sector agrícola.

Artigo de opinião de João Portugal Ramos (Presidente do grupo João Portugal Ramos Vinhos)

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